17 setembro 2006

CHILE – DE SANTIAGO A VALPARAÍSO

O voo que me leva a Santiago do Chile cruza a cordilheira dos Andes, já próximo do destino. Olhando para baixo, vê-se um mar de montanhas, algumas das quais com os cumes cobertos de neve.
A aterragem faz-se num largo vale, onde a cidade de Santiago foi edificada.
Mais tarde, constato que a cidade está de facto cercada por montanhas, mais altas a oriente que a ocidente.

O Chile ocupa um território com uma largura média semelhante à de Portugal (cerca de 200 km), e com mais de 4.000 km de extensão, de norte a sul, de costa do Oceano Pacífico.
Se transpuséssemos esta escala territorial para a Europa, seria como se Portugal se prolongasse até à Escandinávia.
No Chile, o mar nunca está muito distante, pelo que a oferta de peixe e marisco nos restaurantes é abundante.
Para experimentar, vou jantar ao Restaurante Azul Profundo, que tem uma decoração alusiva ao mar, com alguns apontamentos literários, como as bases de papel que são colocadas nas mesas, nas quais estão impressos textos relacionados com o mar, entre os quais um poema de Fernando Pessoa, intitulado “o mar”. Aliás, numa das paredes do restaurante estão expostos vários retratos de escritores de renome, entre eles Fernando Pessoa.

A Plaza de Armas é a principal praça do centro de Santiago, e é também o ponto fulcral da vida da cidade. Foi aqui que esta nasceu no século XVI.
Hoje, a Plaza de Armas, à parte a arquitectura monumental que a enquadra, é um local de encontros da população. Aqui se encontram famílias, namorados e amigos. Num dos lados da praça, ao lado do coreto, dezenas de mesas com tabuleiros de xadrez, são utilizadas por homens que jogam concentrados.
Noutro lado, uma feira de artesanato atrai a atenção dos passantes. Vários fotógrafos oferecem os seus serviços, com cavalos de madeira para as crianças.
Em lados opostos da praça, dois mimos divertem os transeuntes (lembram-se do mimo que vi e comentei em Buenos Aires? Também ele é chileno).

Nas imediações da Plaza de Armas está sedeado o Museu Chileno de Arte Precolumbino, que apresenta uma excelente colecção de objectos provenientes das muitas culturas indígenas que povoaram a América do Sul e Central, antes da chegada dos europeus a estas regiões.
No que ao Chile diz respeito, tomei conhecimento do povo Mapuche, que constituiu uma excepção à tragédia que ocorreu com o extermínio de quase todos os povos nativos dos três continentes americanos.
Os Mapuche, tinham o seu território na metade sul do actual Chile. No período Inca, resistiram à colonização destes, que expandiram o seu império para sul, até ao limite norte do território Mapuche.
Mais tarde, já no período de colonização espanhola, os Mapuche mantiveram igualmente a sua integridade territorial, tendo infligido várias derrotas ao exército castelhano.
Acabaram por ser subjugados, já no final do século XIX, pelos chilenos, sendo hoje uma parte importante das comunidades residentes naquela região.

Ainda perto da Plaza de Armas, está o Mercado Central, imóvel interessante em cujo interior sobressaem as peixarias, que apresentam uma grande variedade e quantidade de peixe e marisco, provenientes sobretudo dos mares do sul do Chile. Inteligentemente, no mesmo edifício estão instalados vários restaurantes cuja oferta gastronómica se restringe praticamente ao peixe e marisco.
O local é frequentado ao almoço, tanto por residentes como por visitantes, e movimenta muita gente.
A actividade de mercado extravasa o edifício atrás referido, prolongando-se para ruas adjacentes.

Também no centro da cidade, está localizado o Palácio governamental de La Moneda, nas imediações do qual está agora instalado um centro cultural, projecto de interesse provavelmente politico, a avaliar pelos sinais visíveis no próprio espaço. O projecto arquitectónico, contemporâneo, de autor chileno, segue as linhas estéticas dominantes do nosso tempo.
A propósito de cultura e política, estou a visitar o Chile no chamado mês da pátria, Setembro, durante o qual se celebra a independência do país, há quase duzentos anos.
Por todo o lado se vêm bandeiras do Chile, e muitos outros adereços tricolores alusivos à nação, estando programados festejos nacionais (“Fiestas Patrias”) sobretudo para o período de 15 a 18 de Setembro.
Também em Setembro, a 11, se comemora o golpe de estado que derrubou o governo de Salvador Allende, em 1973.
Constatei que ainda hoje, o Chile está dividido acerca desse período da sua história, tendo-se verificado também este ano, manifestações violentas em vários pontos do país, nomeadamente em Santiago.

Esta cidade, várias vezes devastada por terramotos violentos, não é propriamente uma urbe encantadora, tendo algumas “ilhas” de interesse, como por exemplo a área de Providencia, urbanizada nas últimas décadas, onde convivem de modo harmonioso, edifícios de empresas com espaços residenciais e comerciais.
No limite deste lado da cidade, encontra-se a interessante feira de artesanato conhecida como Los Dominicos, que está localizada num recinto arborizado. Pelas características do espaço, fez-me lembrar a Feira de Artesanato do Estoril, minha vizinha em Portugal.

Depois de três dias em Santiago, parto para Valparaíso, cidade litoral, situada a pouco mais de 100 km a ocidente de Santiago, considerada património da humanidade pela UNESCO.
De autocarro, percorro uma auto-estrada que me faz lembrar as da Europa, e esquecer as estradas dos países anteriormente visitados na América do Sul.
A paisagem acidentada, é predominantemente verde, com apontamentos coloridos de flores campestres que anunciam a Primavera, primeiro com terrenos agrícolas, e mais tarde com florestas de coníferas e eucaliptos.
Valparaíso, cidade portuária importante para o trânsito marítimo entre a Europa e as Américas, antes da abertura do Canal do Panamá, que ocorreu no primeiro quartel do século XX, foi quase totalmente destruída por um violento terramoto há cem anos atrás.
Hoje, a actividade portuária de mercadorias é reduzida, embora a de navios de passageiros, chamados de cruzeiro, esteja a aumentar, correspondendo ao desenvolvimento da indústria do turismo na globalidade.
A cidade apresenta-se decadente, com a agravante do seu património arquitectónico se encontrar maioritariamente degradado, para além das construções medíocres que nas últimas décadas ocuparam uma boa parte da área litoral, desqualificando-a face ao que seria desejável.
O que se salva nesta cidade, mais uma vez, é a localização privilegiada, numa longa baía, estando a cidade espalhada pelas encostas vizinhas da mesma, em anfiteatro.
Como a cidade se desenvolveu em cotas ascendentes ocupando as colinas que abraçam a baía, no final do século XIX, começaram a ser edificados ascensores que visavam o transporte de pessoas entre os vários planos urbanos.
Estes ascensores, 28 na totalidade, foram instalados entre 1883 e 1916, existindo hoje em funcionamento 15, dos quais apenas 1 é vertical, sendo os restantes em plano inclinado.
Se compararmos os ascensores de Valparaíso com os de Lisboa, podemos aferir que os de Valparaíso são mais modestos, embora mais numerosos. Tal como os de Lisboa, ainda hoje servem os residentes, embora também sejam bastante frequentados pelos turistas.
Aqui fico alojado num pequeno hotel, Brighton, instalado numa casa vistosa do início do século XX, posterior ao terramoto de 1906 que arrasou grande parte da cidade.
A localização do hotel é privilegiada, no “Cerro Concepción”, um dos locais mais interessantes da cidade, tendo uma vista panorâmica sobre a cidade e a baía.
O hotel como tal, é pobre, pelo que me contentei com um quarto minúsculo, no qual ao abrir os braços, quase sempre tocava nas paredes, ou no tecto.
Uma particularidade deste hotel é que, a recepção funciona no bar/restaurante, cujo espaço é interessante.
Em Valparaíso provei a bebida mais característica do Chile, o pisco, uma aguardente produzida a partir de uvas. A minha prova resumiu-se ao chamado pisco sour, que é a aguardente misturada com sumo de limão, servido gelado.
É uma bebida agradável, normalmente apreciada como aperitivo. Tal como a caipirinha, se bebermos um pisco sour ficamos bem, mas se bebermos o segundo, podemos ter dificuldade em nos levantarmos da cadeira.
Da gastronomia refiro que aqui comi bom peixe, como era de esperar, e o melhor restaurante que visitei foi o Café Turri, situado nas proximidades do hotel onde estive. Este restaurante é uma referência na cidade mas, esteve encerrado durante algum tempo. Agora, reabriu por iniciativa de várias pessoas, entre elas um jovem chefe de cozinha francês, que naturalmente oferece um menu com influências gaulesas, de qualidade.
Uma parte deste texto foi escrito precisamente no Café Turri, onde existe ligação à internet sem fios, após um bom jantar.

Valparaíso tem como vizinha a cidade de Viña del Mar, área urbana distinta, mais dedicada ao turismo balnear.
Para além da estrada costeira que liga as duas cidades, existe há pouco tempo um comboio moderno que oferece comodidade e rapidez, sem poluir o ambiente.
Da cidade pouco há para dizer, a não ser a curiosidade de ter um Parque público, Quinta Vergara, que é hoje propriedade municipal, onde outrora viveu uma família da qual, um dos membros foi o fundador da cidade de Viña del Mar. Este, casou-se com uma senhora, neta dos primeiros habitantes e proprietários da Quinta Vergara, sendo a curiosidade o facto do então fundador da quinta ser um abastado comerciante português, que aqui viveu com a sua família, no século XIX.
A esposa do então proprietário era apaixonada por plantas e jardins, pelo que se dedicou a criar um jardim com espécies exóticas, provenientes de várias regiões do mundo, com a colaboração do seu filho que sendo marinheiro, viajava para outras paragens.
Hoje, a Quinta Vergara tem para além do parque, um museu de arte instalado no Palácio Vergara, que não é a construção original da quinta, já que esta desabou aquando do terramoto de 1906, e também um gigantesco anfiteatro para espectáculos musicais, de construção recente.

Aqui, chego ao oceano Pacífico, que espero percorrer nos próximos meses, quer ao longo dos continentes americanos, quer mais tarde para chegar à desejada Nova Zelândia.
Agora, vou para sul, já que a Primavera está a chegar. Estou desejoso de voltar aos grandes espaços naturais.

5 comentários:

Anónimo disse...

Fernando, amigo viajante!
Etive em Natal durante 3 semanas em belas e merecidas férias..um dolce fare niente, ao som de ondas a baterem na praia, mares quentinhos ( como em Luanda),muita agua de côco e algumas caipirinhas que ninguem é de ferro!
Estou de volta ao Rio e diverti-me com as tuas andanças. Realmente é um privilegiado e tens aproveitado bem essa tua viagem!
Dia 7 estarei com a turma da José Oliveira Barbosa inclusive Chico Aurélio que é presença constante e assidua aos nossos encontros.
Vou dar o teu site ao "povo" JOB e sugerir que eles dêm uma espreitadela.
Beijos para ti e "bons ventos" !
Da sempre amiga
Katy

Unknown disse...

Olá, ainda não há fotos do Chile, que pena!!
Beijo com uma pontinha de inveja
Carla

Anónimo disse...

Obrigada Fernando, por mais um país que acabei de conhecer.Sei que não é o suficiente, mas abres o apetite para uma visita.
Aproveita a Primavera que a nossa está a acabar.
Um beijo,

Ana

Unknown disse...

A Edna pediu-me para deixar aqui um beijo de saudades. Aqui fica.

De mim outro
Carla

Anónimo disse...

Olá Fernando,
Não temos tido muito tempo para enviar comentários mas temos sempre que possível seguido o teu trajecto e visto as fotos.
O nosso desejo é que continues a ter uma boa viagem.
Bijos e abraços da familia Gominho