A ILHA DO NORTE – DE HAMILTON A WELLINGTONDe Whangamata até
Hamilton, para sudoeste, a estrada percorre maioritariamente extensos campos agrícolas e pequenas povoações.
Chegado a Hamilton, provavelmente a terceira cidade mais populosa da Ilha do Norte, dirijo-me a casa da Cecilie, seguindo as instruções que ela me havia enviado por e-mail. Sem dificuldades, encontro a casa e a Cecilie.
Não nos víamos há quase 13 anos, quando eu e a Ana visitámos Hamilton, onde na altura viviam a Cecilie e o Gregor, seu companheiro, entretanto falecido.
Naturalmente, revemos bons momentos então vividos, e recordamos amigos comuns, nomeadamente a Clara e o Jack, sendo este, companheiro de música da Cecilie. A Cecilie é pianista de música clássica, e por isso, tem acompanhado o Jack em muitos recitais dados na NZ, onde o Jack se desloca com alguma regularidade.
No dia seguinte à minha chegada, saímos de Hamilton, para passear de carro pela região.
O primeiro destino está algumas dezenas de quilómetros a sul da cidade. É uma área conhecida pelas muitas grutas que existem no subsolo, nomeadamente umas onde existem uns seres vivos peculiares, raros, chamados em inglês, “glowworms”. Estes seres minúsculos, têm a particularidade de emitirem luz, quando num ambiente escuro, o que sucede nestas grutas.
As grutas de
Waitomo, que eu tinha visitado há 13 anos, são uma das principais atracções turísticas desta região.
A visita às grutas onde vivem os “glowworms” é feita com a supervisão de guias, e culmina com um passeio de barco, em silêncio, às escuras, no leito dum rio subterrâneo, sobre o qual, no tecto das grutas, vivem milhares de “glowworms”.
O efeito luminoso causado por estes é interessante, parecendo que o tecto das grutas se transforma no céu estrelado.
O passeio de barco termina no local onde o leito do rio volta à superfície, numa área de vegetação luxuriante.
Sendo esta região rica em grutas, existem outras que estão abertas ao público, pelo que decidimos visitar uma nova para ambos, a gruta Ruakuri.
Sem a presença de “glowworms”, nem do rio subterrâneo, esta gruta revela-se mais interessante que a anterior, no que respeita a formações calcárias de estalactites e estalagmites, com tamanhos e formas diversas, que dão asas à nossa imaginação.
De regresso à superfície, viajamos para ocidente, em direcção à costa deste lado do país, onde ainda não tinha estado.
Esta estrada secundária, sinuosa, é apenas um exemplo da invulgar beleza das paisagens neozelandesas, que podem ser observadas a partir das estradas. Para além das grutas, e de percursos pedestres que lhes estão associados, paramos numa área onde acedemos a uma bela e imponente catarata (Marokopa Falls), para mais tarde passarmos em frente a um ponte natural, em rocha, que já conheço de anterior visita, pelo que não paramos aqui, para podermos alcançar outros locais igualmente interessantes.
Ao aproximarmo-nos do litoral, contornamos uma grande enseada, quase seca, pelo facto de estarmos no período de maré baixa.
Chegados à costa, em
Kawhia, vamos directos à praia, onde a Cecilie garante existirem erupções de água quente. Esta praia, tem muitos quilómetros de extensão, um areal profundo, de areia escura, e está praticamente deserta, apesar de estarmos no Verão, com um belo dia, e ser sábado.
Quando chegámos, ao final da tarde, encontrámos algumas pessoas, não mais que meia dúzia, que cavavam na areia, talvez à procura da água quente.
Nós os dois, aproveitámos para tomar banho, mesmo sem a água quente, num mar com fortes correntes e ondulação. Esta costa, sobretudo para norte, é popular entre os surfistas, pelas características do mar.
Quando saímos da praia, olhámos para ambos os lados do areal, e não vislumbrámos qualquer outra pessoa.
Seguimos o nosso passeio, desta vez numa estrada em terra, para norte, em direcção a
Raglan, onde vamos jantar, após o que regressamos a Hamilton.
Nos dias seguintes, ficamos em Hamilton, aproveitando para passear na cidade, particularmente num extenso parque designado Hamilton Gardens.
Este parque foi construído num local onde anteriormente existiu um aterro sanitário, e é um espaço modelar pelas valências que oferece aos utentes. Para além das áreas arborizadas que acompanham as margens do rio Waikato, um dos maiores da NZ, no qual se pode tomar banho em plena cidade, o parque tem uma série de jardins temáticos, dedicados a diversas culturas, como por exemplo, Índia, Itália, Japão e Inglaterra. Este conceito é interessante já que, para além de espécies botânicas características dos países representados, os jardins temáticos estão desenhados de acordo com a estética dos mesmos, contendo alguns elementos arquitectónicos e decorativos alusivos às respectivas culturas.
Nesta altura do ano, decorre neste parque um Festival Cultural, que inclui espectáculos diversos, de música, teatro e ópera, bem como actividades destinadas às crianças.
Numa das noites passadas em Hamilton, pudemos assistir a um recital de piano, pelo russo Konstantin Scherbakov, que está a efectuar uma digressão pela NZ.
O recital decorreu na principal sala de música da cidade, designada WEL, projecto recente, de estilo contemporâneo, atraente, sem ser pretensioso.
Numa outra noite, jantámos com um casal residente em Hamilton, Vera e Wayne, ela holandesa e ele neozelandês, amigos da Cecilie, que eu tinha conhecido aqui em Hamilton, em 1994.
Agora, é tempo de deixar Hamilton, para mais tarde regressar, quando voltar do sul, para então me despedir da Cecilie.
Para já, vou voltar ao lado oriental da Ilha do Norte, que irei percorrer até chegar a Wellington.
Hoje, viajo até
Tauranga, a principal cidade da região chamada Bay of Plenty, e um dos principais portos de mercadoria do país. Os dois principais produtos que são exportados a partir do porto de Tauranga são, o kiwi (fruta) e madeira.
Por sugestão da Cecilie, vou ficar hospedado em casa dum casal de amigos dela, a Stephanie e o Colin, ali residentes.
Chegado a Tauranga, procedo como habitualmente na NZ. Dirijo-me primeiro ao posto de informações turísticas, onde procuro informações sobre a região, e daí sigo para casa do casal que me recebe com simpatia.
O Colin, que é um artesão de violinos, quase reformado, oferece-se para me guiar numa visita à cidade e arredores, o que aceito.
Assim, no dia seguinte à minha chegada, partimos os dois para um passeio ao longo do qual, atravessamos a área portuária, situada numa baía interior, para alcançarmos a costa, junto ao Monte Maunganui, um vulcão extinto, a partir do qual se alcançam muitos quilómetros de praia, como sempre, quase deserta.
Tauranga tem uma área central à beira da baía, com bastante comércio, onde mais tarde jantamos os três num bom restaurante, Kestrel, que funciona entre uma estrutura construída em terra e uma embarcação, que em tempos idos serviu de transporte de passageiros entre Auckland e o subúrbio de Devonport.
De Tauranga, parto em direcção a
East Cape, o ponto mais oriental da NZ.
Para lá chegar, percorro uma estrada costeira sinuosa, de grande beleza cénica, ao longo da qual passo por inúmeras baías, umas mais extensas que outras, com praias de areia ou pedra. No lado de terra, sucedem-se pequenas montanhas, debruçadas sobre a costa, com muita vegetação.
Esta região tem poucos habitantes, o que para a média da NZ significa que aqui não há quase ninguém, e a maioria dos veículos com que me cruzo são de pescadores, atraídos pela abundância de peixe.
Muitos dos carros dos pescadores trazem barcos atrelados, o que confirma a paixão dos neozelandeses por barcos. Aliás, na NZ, para além da grande quantidade de marinas para as embarcações de recreio, também se encontram com facilidade e em boas condições, por toda a costa, pontos de acesso ao mar.
Antes de chegar ao ponto mais oriental, faço uma paragem de duas noites numa aldeia,
Te Kaha, ficando alojado numa casa de turismo de habitação, Tui Lodge.
Esta casa, inserida numa propriedade com pouco mais dum hectare de área, está localizada a cerca dum quilómetro da costa, sendo que, da casa se alcança o mar e neste, ao longe, a pequena ilha White Island, ocupada por um vulcão activo há vários anos, que é uma das atracções desta região.
O Tui Lodge é uma casa confortável, habitada pelos seus proprietários, Joyce e Rex, e um dos filhos deles, Peter, todos neozelandeses. O Rex e a Joyce são excelentes anfitriões, com um sentido de humor apurado. O Rex, com 83 anos de idade, e a Joyce, à qual não perguntei a idade, cuidam de tudo, e não têm empregados.
Antes de viverem neste “paraíso”, habitaram na Nova Guiné, da qual guardam boas recordações.
Nos dois dias que com eles passei, conheci também um outro filho deles, Malcolm, que veio passar uns dias com os pais, sobretudo para caçar.
Aqui, aproveitei o tempo para conhecer melhor o litoral da região, com pequenas baías rochosas, e acessos difíceis ao mar, quer pela morfologia do terreno, quer porque a maior parte dos terrenos costeiros são propriedade de Maoris, que restringem o acesso ao mar.
Frente a uma das pequenas baías encontrei um local delicioso: uma pequena propriedade rural, Pacific Coast Macadamias, com um pomar de árvores que produzem macadamias (este é o nome inglês das nozes produzidas por estas árvores, do qual desconheço o correspondente nome português).
Inserido no pomar, existe uma loja, na qual são servidas iguarias feitas a partir da macadamia. Desde as nozes naturais, a gelados, passando por doces diversos e manteiga, há muito para nos atrair.
Novamente a caminho, em direcção a East Cape, passo por baías cada vez mais isoladas e agrestes, onde para além de pedra, impressiona a quantidade de escolhos de madeira que o mar traz para terra. Ao longo da estrada, cruzo vários rios, com pouca água, pela época do ano em que estamos. Invariavelmente, a água dos rios é limpa, assim como os leitos, sem lixo, e normalmente encontro pessoas a tomar banho, e/ou a pescar.
Para se chegar a
East Cape, há que fazer um desvio de cerca de 20 km, regressando posteriormente pelo mesmo caminho à estrada principal, a partir da povoação de Te Araroa. Este percurso, feito sempre à beira-mar, revela uma das costas mais inóspitas que conheço, devassada por ventos fortes, e menos afectada pelos seres humanos que, como sabemos, temos uma especial predilecção por qualquer pedaço de terra que esteja próximo do mar, sendo que, muitas vezes, essa atracção proporciona resultados desastrosos.
Aqui, quase não se vêm construções, e a maior parte do terreno é ocupada por propriedades rurais, vendo-se bastante gado a pastar.
Chegado ao final da estrada, deparo-me com uma colina apreciável, no topo da qual se encontra um farol. Hesito quanto à subida, e acabo por ficar cá em baixo, a olhar para o alto. Estou condicionado pelo facto de estar a viajar sozinho, o que me leva a ter cuidados especiais no que respeita a deixar o carro em locais ermos, com toda a minha bagagem, e também porque ainda tenho várias horas de viagem, até chegar ao meu destino diário.
Assim, volto à estrada principal, não sem antes parar junto ao mar para molhar os pés, num dos locais mais remotos e isolados em que estive.
Daqui até Gisborne, para sul, a estrada afasta-se da costa, voltando a esta esporadicamente, para revelar novas baías e algumas povoações. Ao longo desta estrada, terrenos agrícolas e muito gado, numa paisagem campestre, com menos vegetação que no lado oposto da Península.
Gisborne, é uma pequena cidade, a mais oriental da NZ, e por isso a que primeiro vê o sol a nascer no mundo. É conhecida particularmente pelas extensas praias frequentadas por surfistas, e pelo facto histórico de, ter sido aqui que, em 1769, o Capitão Cook, aquele que comandou a primeira viagem inglesa a estas paragens, avistou terra e aportou.
De Gisborne, sigo para sul, para ficar na pequena
Península de Mahia, outrora uma ilha.
Esta é uma região afastada de centros populacionais importantes, e por isso isolada. Das pequenas povoações que existem na Península, a menos pequena é Mahia Beach, no lado ocidental, onde fico.
Aqui, hospedo-me numa casa de turismo de habitação, Seashore B&B, que está literalmente, sobre a praia. Os proprietários, Marie e John, estabeleceram-se neste local há poucos anos, depois de terem vivido numa região interior, não muito distante, onde trabalharam como agricultores.
Agora, a Marie cuida da casa e dos hóspedes, e fá-lo de modo exemplar, e o John trabalha na construção e manutenção de imóveis, dedicando-se à pesca nas horas vagas.
Nesta região, as extensas praias estão praticamente desertas. Numa delas, Pukenui Beach, longa de vários quilómetros, caminhei durante duas horas, ao longo das quais apenas vi um casal, e uma mulher local, que passeava com três cães, que corriam incessantemente pela praia, brincando como crianças, e perseguindo as aves marinhas que por lá andavam.
Prossigo a minha viagem para sul, até Napier. Pelo caminho, observo extensos campos agrícolas, com muita vinha (esta é uma das principais regiões vinícolas da NZ), e muito gado. Passo por uma área de grande beleza paisagística, do Lago Tutira, onde não paro.
Napier é uma pequena cidade situada no litoral, reconhecida como uma jóia arquitectónica do período Art Deco.
Embora a cidade tenha sido fundada no século XIX, antes do estilo Art Deco surgir, em 1931, um violento terramoto, seguido por incêndios, destruiu grande parte da cidade.
Felizmente, graças aos esforços e visão das autoridades, Napier renasceu dos escombros, em poucos anos, com uma imagem moderna. Os arquitectos contratados para a execução dos projectos urbanísticos e de arquitectura, optaram pelo estilo Art Deco, em voga na década de 30.
Hoje, Napier tem um dos melhores conjuntos arquitectónicos no mundo, daquele estilo, que constitui a sua imagem de marca.
Um passeio pela cidade, revela formas e cores que me fazem lembrar cenários de filmes.
De Napier, viajo para sul, para a última etapa na Ilha do Norte, antes de seguir para a do Sul. O destino do dia é Wellington, a capital da NZ.
Ao longo dos mais de 300 km do percurso, passo por várias pequenas cidades, parando em Hastings, para visitar uma feira semanal de produtos agrícolas da região, onde entre doces, vinhos, fruta, azeitonas e outros produtos locais, converso com um imigrante alemão que ali vende compotas. Da sua experiência de vida, de três anos, na NZ, diz-me que está tão satisfeito que, não voltará a viver na sua terra natal. A qualidade de vida que aqui tem, é incomparavelmente superior à que tinha na Alemanha, e o clima desta região é muito semelhante ao do Mónaco, sendo o custo de vida muito inferior.
A caminho de Wellington, passo ao largo duma localidade especial, pelo nome. Este, é o nome mais comprido de qualquer localidade do mundo, e é um desafio para qualquer pessoa que o queira decorar (que não é o meu caso).
Socorrendo-me do meu mapa da NZ, passo a copiar: Taumatawhakatangihangakoauauotamateaturipukakapikimaungahoronukupokaiwhenuakitanatahu.
A entrada em
Wellington, revela uma cidade espremida entre o oceano e montes que lhe estão próximos, ao longo dos quais a cidade vai crescendo.
É numa destas elevações que vivem a Kristine, filha da Cecilie, com quem estive em Hamilton, o marido Tony, e o filho Ryan. É em casa deles que fico.
Wellington tem outra particularidade, que é a de ser uma cidade ventosa, pela sua localização, na ponta sul da Ilha do Norte, debruçada sobre o Oceano Pacifico. Na verdade, não me lembro de outra cidade onde tenha estado que seja tão ventosa como esta, com tanta regularidade.
Aqui, opto por ficar apenas dois dias, para poder conhecer minimamente a capital da NZ já que, começo a temer pela falta de tempo, para visitar o que de mais importante a Ilha do Sul tem para me oferecer. Para além disso, todas as pessoas com quem tenho falado, que conhecem ambas as ilhas, me garantem que as belezas naturais da Ilha do Sul transcendem as da Ilha do Norte.
Em Wellington, visito essencialmente a área central da cidade, próxima do mar, um tanto confusa do ponto de vista urbanístico, na qual se encontra o principal museu da cidade, conhecido como Museu da NZ/Te Papa (
http://www.tepapa.govt.nz/).
O edifício, de grandes dimensões, construído há cerca de dez anos, é mais interessante pelo interior, independentemente do espólio museológico bastante diverso, do que pelo exterior.
Sem que tenha visitado em pormenor as muitas áreas do museu, detive-me na loja (
http://www.tepapastore.co.nz/), excelente, onde encontrei a melhor colecção de artes tradicionais de inspiração Maori, que pude ver até hoje.
Fora da área central da cidade, no alto duma das elevações sobranceiras ao mar, está o Jardim Botânico, famoso pela sua beleza paisagística.
Para lá chegar, utilizo o “cable car” que me leva sem esforço colina acima, do alto da qual se alcança um amplo panorama.
Dos poucos restaurantes que conheci em Wellington, destaco o Shed 5, instalado num antigo armazém portuário. Aqui, para além dum bom peixe, deliciei-me com as primeiras ostras de Bluff, pequena localidade situada no extremo meridional da Ilha do Sul, famosa pela qualidade das ostras que ali se produzem. Estas, só estão disponíveis num período do ano, tendo a época começado há poucos dias. A qualidade das saborosíssimas ostras ficou comprovada, pelo que aguardo por novas oportunidades nas próximas semanas.
Agora é tempo de deixar a Ilha do Norte, onde voltarei mais tarde, depois da visita à vizinha do Sul. Até agora, em quase um mês de utilização do carro alugado, percorri cerca de 2.500 km.
Vou pois apanhar o barco, que me levará mais para sul, para terras ainda desconhecidas.