17 julho 2008

Perugia: festa estudantil.

PERUGIA

Saio numa estação que está identificada como de Perugia – Universidade, e só depois de estar fora do comboio é que constato que esta não deve ser a estação que me interessa.
Seja como for, não é grave. Depois de solicitar ajuda a uma estudante que estava a sair da Universidade, apanho um autocarro para o centro da cidade (acabo por viajar de graça, pois o condutor só me venderia o bilhete se eu tivesse o valor exacto da tarifa, o que não acontecia).
A viagem ainda é longa, sempre a subir, e pouco antes da chegada começa a chover com intensidade. Como o meu chapéu-de-chuva estava dentro da mala, saio do autocarro para me abrigar da chuva, à porta de uma gelataria (não, desta vez não comi nenhum gelado …).
Não conhecendo a cidade, embora soubesse que tem uma topografia difícil, optei por apanhar um táxi, para me levar ao hotel, que sabia não estar longe.
Como chovia, esperei quase uma hora até conseguir encontrar um táxi disponível que, me levou então ao hotel, em poucos minutos.
Este, Hotel Rosalba, tem uma boa localização, e comodidade suficiente para o meu corpo mas, os proprietários não são simpáticos, o que diminui a minha satisfação.

Quando saio do hotel para me dirigir ao centro da cidade, apercebo-me da particularidade de existir uma rede de escadas rolantes que transportam as pessoas, devido aos grandes desníveis existentes. O que é ainda mais curioso é que, uma parte desses percursos está inserida em galerias medievais, com estruturas que remontam ao século XVI, e vestígios ainda mais antigos, do período Etrusco.
Aliás, este não é o único aspecto contrastante, entre o antigo e o contemporâneo, que caracteriza Perugia, no que respeita à infra-estrutura de transportes públicos já que, mais tarde, descobri um sistema de comboios ligeiros, automáticos, que circulam dentro da cidade.

Caminhando no centro de Perugia, em direcção à Praça IV Novembro, onde se encontra a Catedral e outras atracções locais, como é o caso da Fonte Maggiore, construída no século XIII, ricamente ornamentada com esculturas e baixos-relevos, e considerada a mais bela de Itália, apercebo-me da existência de um palco provisório situado ao lado da fonte.
Mais tarde, depois do jantar, voltando a esta praça, encontrei-a repleta de público maioritariamente jovem, que assistia a um espectáculo de música, de um grupo italiano.
Este espectáculo, e os que aconteceram nas noites seguintes, estavam relacionados com o final do ano lectivo para as universidades locais, e também com um encontro/feira de universidades italianas, que aqui estavam reunidas, para divulgarem os seus serviços.

Perugia, a principal cidade da região da Umbria, tem também um importante património artístico e arquitectónico, pelo que dediquei algum tempo a visitar algumas das atracções culturais locais.
O principal museu de Perugia, a Galeria Nacional da Umbria, apresenta uma vasta colecção de obras de arte, particularmente pinturas, de arte sacra, onde se destacam dois dos mestres que muito trabalharam nesta região.
O primeiro, mais famoso, conhecido como Perugino (apesar de não ter nascido em Perugia), e o segundo, seu contemporâneo (século XV), Pintoricchio (autor dos magníficos frescos da belíssima biblioteca da Catedral de Siena), sobre o qual estava patente uma exposição temporária, retrospectiva da sua vida e obra.
À parte o inegável valor das obras expostas, destes e de outros artistas, quero realçar a qualidade dos espaços expositivos deste museu, que primam pela elegância e bom gosto, sem excessos decorativos.
Em local próximo do museu, no mesmo edifício, o “Pallazzo dei Priori”, está instalado o Collegio del Cambio, local onde os banqueiros locais exerciam as suas actividades cambiais. Aqui, as paredes e tecto da sala principal estão cobertas por frescos executados por Perugino, no final do século XV, que são considerados dos trabalhos mais importantes deste artista.
Nesta obra terá colaborado o seu aluno mais famoso, então com 13 anos de idade, Rafael.
Próximo da Catedral, que era objecto de importantes obras de restauro no interior, encontra-se um local curioso, o Poço Etrusco, exemplo da mestria dos etruscos na arte da construção. Com pelo menos 35 metros de profundidade, foi durante muito tempo a principal fonte de abastecimento de água à população da cidade.

Dos restaurantes visitados em Perugia, destaco a Pizzeria Mediterranea, e a Osteria del Gambero, este para apreciadores da boa mesa e também de vinhos, com o serviço de mesa assegurado pela Laura, romena, atenciosa e decidida.

Enquanto estive em Perugia, tratei de alugar um carro, para o restante percurso desta viagem. Assim, vou visitar Assisi, situada a curta distância de Perugia.
Assisi, é um importante local de peregrinação católica, devido a S. Francisco de Assis que aqui viveu.
Embora a mim não me inspirem os motivos religiosos, mesmo que os respeite, tinha curiosidade em conhecer a localidade, e os templos dedicados a S. Francisco.
Inevitavelmente, até porque me desloco a Assisi num domingo, encontro a cidade com muitos visitantes, tanto italianos como estrangeiros.
A localização de Assisi é semelhante à de dezenas de outras localidades nestas regiões, alcandorada numa elevação, com o casario de pedra harmonioso a espalhar-se pelas encostas. No caso de Assisi, ao aproximar-me, observo numa das extremidades da povoação, um conjunto arquitectónico cujo volume, muito superior ao das restantes construções, identifico como sendo a Basílica de S. Francisco.
Estaciono o automóvel no extremo oposto da cidade antiga, e caminho pelo interior, sempre a descer, percorrendo ruas com muito comércio, até chegar ao limiar da Basílica, situada a alguma distância do casario urbano, o que permite uma observação cuidada.

A Basílica de S. Francisco foi edificada no século XIII, poucos anos após a morte do próprio S. Francisco, e é uma obra de engenharia notável, já que foram construídas duas igrejas no mesmo terreno, uma sobre a outra.
Assim, começo por visitar a igreja inferior, debaixo da qual se encontram sepultados os restos do corpo de S. Francisco, e de quatro dos seus companheiros. Este espaço, de grande beleza formal, sem ostentação, foi criado já no século XX, substituindo um outro túmulo mais elaborado, construído no inicio do século XIX, quando foi finalmente descoberto o local onde o corpo de S. Francisco havia sido secretamente sepultado por alguns dos seus discípulos.
Regressando à igreja inferior, apresenta-se ricamente adornada com frescos em toda a extensão das suas paredes e tectos, sendo que tem um pé direito relativamente baixo, talvez por necessidades estruturais, já que suporta a igreja superior.
O ambiente interior é acolhedor, com pouca luz natural, convidativo à introspecção e, apesar do elevado número de visitantes, conseguimos lá estar em relativo silêncio, sobretudo pelos frequentes apelos feitos por funcionários para que os visitantes não façam barulho.
A igreja superior, de estilo diferente da sua vizinha, com mais luz natural e um pé direito elevado, tem um extraordinário conjunto de 28 frescos dedicados à vida de S. Francisco, do final do século XIII, da autoria de Giotto, o mais importante de todos os artistas que trabalharam neste projecto grandioso.

De regresso ao local onde havia deixado o carro, percorri outras ruas da cidade, que me deixou uma impressão favorável, passando na Praça “del Comune” onde pontifica a fachada do Templo de Minerva, construção monumental do período Romano, que posteriormente foi adaptado para servir de entrada para uma igreja.
A curta distancia desta praça, encontra-se a La Bottega del Pasticceria, uma pastelaria e gelataria de excelente qualidade.

No dia seguinte, deixo Perugia para me dirigir para sul, para Bevagna.
Aqui chegado, procuro alojamento, que encontro rapidamente. Escolho o Hotel Palazzo Brunamonti, excelente, pela relação qualidade/preço.
O hotel está localizado na rua principal da vila, a poucas dezenas de metros da praça principal, que tem duas igrejas construídas no final do século XII, San Silvestro e San Michele, situadas uma em frente à outra, com interiores austeros, sem a parafernália de obras de arte exuberantes que quase sempre enchem as igrejas católicas italianas.
De resto, Bevagna é uma vila pacata, com casario antigo, totalmente rodeado por muralhas medievais. Aqui, a vida ainda decorre ao ritmo do prazer pessoal, isto é, sem as pressas crónicas que atormentam a maioria das pessoas que vivem nos maiores centros urbanos.
Passeando pelas ruas da povoação, sem pressas, constatei da antiguidade da mesma, que remonta ao período Etrusco, visitando uma construção do tempo Romano, que é parte de um antigo anfiteatro, onde existe um interessante e complexo engenho hidráulico.
Hoje, o local pode ser visitado através de uma instituição privada local, Compagnia delle Arti, que gere este património, do qual também faz parte uma habitação medieval, equipada com mobiliário e utensílios da época, ou nalguns casos, réplicas, e uma loja onde algumas destas são vendidas.

No primeiro de dois dias aqui passados, escolhi um pequeno bar/restaurante para almoçar, La Bottega de Asù, situado na rua principal, à entrada da praça.
Como o ambiente exterior era convidativo - pouco trânsito, pessoas a caminharem a um ritmo tranquilo, e tempo agradável – sentei-me numa mesa na rua, tendo antes cumprimentado o casal que estava na mesa ao lado.
Este, a Judith e o Jim, norte-americanos, estão a fazer uma viagem a Itália (não sendo a primeira) com características diferentes. Como ambos gostam de caminhar, estão empenhados em percorrer esta região a pé, fazendo trajectos diários que variam entre dez a vinte quilómetros, por caminhos pedestres, assinalados em mapas fornecidos pela empresa à qual contrataram a viagem. Quanto à bagagem, aquela de que não precisam durante as caminhadas, fica a cargo da empresa, que a transporta diariamente para os hotéis que lhes estão reservados.
Aqui em Bevagna, coincidiu que ficámos alojados no mesmo hotel, e porque estabelecemos de imediato uma relação amigável, combinámos jantar juntos, no Restaurante Ottavius (amplamente recomendado), onde continuámos a nossa agradável conversa.
A Judith e o Jim já têm mais de 70 anos de idade (cada um …) e, para além de gostarem de Itália, têm cá amigos com os quais se irão encontrar, partilhando com eles um outro prazer, o da música erudita. De facto, o Jim trabalha nos E.U.A., em Nova Iorque, como professor de História da Música, e toca nas horas vagas.
No dia seguinte, a Judith e o Jim, seguiram o seu percurso, em direcção a Spello, para onde eu também fui, mas de carro. Ainda lhes ofereci boleia, o que eles recusaram.
No entanto, casualmente, voltámos a ver-nos em Spello, já que, quando eu me aprestava para sair do restaurante onde havia almoçado, que faz parte de um hotel, os meus amigos caminhantes chegaram da sua etapa diária.
Enquanto o Jim se retirou para o quarto para descansar, a Judith ainda teve força para ir passear comigo pelas ruas de Spello, tortuosas e empinadas, mas engalanadas com muitas flores.

Spello tem também um número apreciável de igrejas embora, não tantas como no passado. De facto, no inicio do século XVII, a povoação tinha então cerca de 2.000 habitantes e 100 igrejas. Uma das igrejas que sobreviveram é a de Santa Maria Maggiore, detentora de um importante património artístico, do qual sobressai um magnífico conjunto de frescos executados em 1501, por Pinturicchio, na Capela Baglioni.

Ainda em Spello, ao caminhar pelas ruas, fui surpreendido por um conjunto de automóveis antigos, da marca Bugatti, que estavam de passagem, no decurso de um passeio pela região.

Ainda a partir de Bevagna, fiz um outro passeio até Montefalco, pequena localidade situada a poucos quilómetros de distância.
O que me atraiu a Montefalco, para além das referências que atestam a autenticidade desta pequena vila, ainda pouco afectada pelo turismo, feitas no guia que estou a utilizar nesta viagem, foi o facto de ter tido conhecimento da existência de pelo menos uma empresa têxtil, sedeada na região, que produz artigos de alta qualidade, para uso doméstico.
Na verdade, acabei por descobrir duas empresas têxteis, que competem no mesmo sector de mercado, ambas com lojas na área central de Montefalco.
De resto, Montefalco é também conhecida por ser o centro de uma pequena região vinícola, onde se produz o reputado vinho de mesa, tinto, Sagrantino.

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