NICARÁGUA – CURTA VISITA
De autocarro, chegamos à fronteira entre a Costa Rica e a Nicarágua, um dos países mais pobres das Américas.
Ali chegados, saímos todos para nos apresentarmos individualmente às autoridades da Costa Rica, após o que reentramos no autocarro, para avançar alguns metros, pagar uma taxa de entrada na Nicarágua, e apresentar toda a bagagem transportada à alfandega, para inspecção. Aqui, valeu-nos a sorte, já que as peças de bagagem inspeccionadas são escolhidas aleatoriamente, através dum semáforo. A nós, saiu a luz verde, pelo que voltámos a levar a bagagem para o autocarro, sem ser necessário abrir os muitos volumes transportados.
Na totalidade, na fronteira, permanecemos cerca de uma hora e meia. Durante aquele tempo, observámos a vida local.
Para além dos trabalhadores estatais de ambos os países, das muitas viaturas pesadas que ali permanecem por muito tempo, até conseguirem autorização para prosseguir viagem, chamaram-nos a atenção os muitos cambistas que transaccionam moeda dos dois países, na via pública. Aqui, pela primeira vez, recorri aos serviços destes agentes, para vender o excedente de Colones, moeda da Costa Rica, comprando Córdobas, moeda da Nicarágua. Na verdade, só utilizei este meio porque o banco da Nicarágua presente na fronteira, não compra Colones.
Para além dos cambistas, surgem muitas mulheres que vendem produtos diversos, sobretudo de alimentação, o que mais tarde, noutros locais, se revela recorrente, denotando a existência de uma forte classe de comerciantes domésticos que vendem de tudo um pouco, muitas vezes envolvendo vários membros de cada família.
Mas, nesta fronteira, no lado nicaraguense, o que mais me despertou a atenção foi a presença dum miúdo de idade inferior a dez anos, que vagueava por entre os presentes com um saco plástico na mão, onde guardava latas de refrigerantes vazias. Quando apanhava uma, colocava-a no chão, na vertical, e com o sapato calcava-a com força para a comprimir, após o que a guardava no saco.
Elucidativo acerca das necessidades económicas deste país, que tem uma elevada percentagem de jovens.
Retomada a viagem para Granada, lá chegamos ao início da noite. Saímos do autocarro, em local inóspito, para apanharmos um táxi que nos levou a uma morada, onde reside uma ex-colega minha, Lilly, norte-americana, que gentilmente nos ofereceu a sua casa.
Só então nos apercebemos que a cidade estava às escuras, por ter faltado a luz.
Assim, chegados à rua da Lilly, encontrámos a casa dela perguntando a algumas pessoas onde vive a senhora americana …
A Lilly vive na Nicarágua há um pouco mais de dois anos, tendo tomado essa decisão na sequência duma primeira visita ao país, e a Granada. Aqui comprou uma propriedade, na qual empreendeu uma série de reformas, ampliando-a, trabalhos que estão em fase de conclusão.
Uma das componentes do seu investimento é um bar, Santa Lucia Social Club, que ainda não está aberto ao público, devido a questões formais.
De resto, a Lilly está satisfeita pela mudança dos EUA para a Nicarágua, onde encontrou uma sociedade mais humana.
A Nicarágua encontra-se actualmente num período de expansão económica, também graças ao interesse de muitos estrangeiros que decidiram investir no país, e nalguns casos aqui residir. Em Granada, provavelmente a cidade com mais interesse arquitectónico do país, pela preservação de muitos dos seus edifícios coloniais, é notória a presença duma comunidade estrangeira residente.
No decurso dum pequeno-almoço, travámos conhecimento com um outro membro desta comunidade, Howard, também norte-americano, residente na América Central há vinte anos. O Howard, mudou-se há alguns anos da Costa Rica para a Nicarágua, e agora, devido à alteração politica anunciada para o inicio de 2007, com a eleição de Daniel Ortega para presidente do país, antevê tempos difíceis, para ele e outros residentes estrangeiros.
Como não pensa voltar a residir nos EUA, admite a possibilidade de se mudar para o Panamá.
Posição distinta, mais optimista, foi-nos manifestada por um outro estrangeiro aqui residente, Peder, dinamarquês, que conhecemos casualmente quando passámos frente a um edifício de sua propriedade, onde está instalado um museu que alberga a sua colecção de cerâmica antiga da região centro-americana.
Só por si, o museu e o seu conteúdo seriam suficientes para destacar esta figura da cidade de Granada. Mas, desde o primeiro contacto com Peder, o que mais me interessou foram sinais de intervenção social relevante dele nas comunidades locais desfavorecidas.
De forma discreta mas objectiva e convincente, Peder falou-nos de dois projectos que lidera, um dos quais visa apoiar o desenvolvimento intelectual, cultural e moral de crianças nicaraguenses, de famílias pobres.
O projecto “Carita Feliz” ( http://www.caritafeliz.org/ ) permite que centenas de crianças desfavorecidas acedam a recursos diversos, de modo a que possam crescer em plano de igualdade com outras crianças. O projecto é tão ambicioso que Peder acredita que futuramente alguns dos seus protegidos serão pessoas influentes na sociedade da Nicarágua.
Sensibilizados pelo alcance desta obra social, eu e a Dina visitámos as instalações da “Carita Feliz”, onde reencontrámos Peder, e confirmámos as melhores expectativas. Ali encontrámos dezenas de crianças empenhadas na prática de actividades tão distintas como costura, informática, artes visuais, cosmética e outras.
Embora não tenha sido solicitada qualquer contribuição financeira nossa, eu propus fazê-lo, pelo que irei em breve, apadrinhar algumas das crianças da “Carita Feliz”.
A estada em Granada coincidiu com as festas da Puríssima, em honra de Nossa Senhora da Conceição. Estas celebrações decorrem na primeira semana de Dezembro, culminando no chamado “dia da gritaria”, no qual os nicos (designação dos naturais da Nicarágua) se manifestam ruidosamente nas ruas das cidades, e em simultâneo exercem a sua fé religiosa. Na verdade, durante todo o período destas festas, foguetes e música ecoam no ar, dia e noite.
Durante as festas da Puríssima, realizam-se diariamente procissões nocturnas, que percorrem algumas das principais ruas das cidades. Em Granada, pudemos assistir a estas manifestações religiosas, participadas por milhares de pessoas, que desfilam pelas ruas, enquanto os moradores das mesmas observam os passantes sentados no exterior de suas casas, que se apresentam engalanadas, de portas e janelas escancaradas.
De referir que as casas de Granada se desenvolvem normalmente ao redor dum pátio interior, e que cada casa dispõe de várias cadeiras de baloiço, muito apreciadas nesta região.
Voltando às festas da Puríssima, paralelamente às procissões, constatamos a presença de inúmeros vendedores ambulantes que seduzem o público com produtos alimentares e outros alusivos ao Natal.
Granada, a cidade mais antiga nesta região, fundada pelos espanhóis no primeiro quartel do século XVI, está situada à beira do Lago Cosivolca, também chamado Nicarágua, um dos dez maiores lagos do planeta.
O lago encontra-se numa região vulcânica, cuja actividade proporcionou a existência de muitas ilhas, a maioria das quais de pequena extensão, chamadas “isletas”.
Uma curiosidade deste grande lago, não muito profundo, é a de ser o único lago de água doce no mundo no qual vivem tubarões. Estes, chegaram aqui através de rios que comunicam com o oceano Atlântico.
Com a estada da Dina quase no final, partimos de Granada para Manágua, num percurso curto de menos de uma hora, feito num pequeno autocarro a abarrotar de passageiros, conduzido por um motorista com espírito competitivo.
Em Manágua, cidade mais populosa da Nicarágua, ficámos alojados num pequeno hotel recomendado pela Lilly, Los Robles ( http://www.hotellosrobles.com/ ).
Situado numa área tranquila da cidade, num edifício antigo de boa traça arquitectónica, com um pátio ajardinado interior, no qual pontificava uma fonte engalanada por algumas lanternas marroquinas, revelou-se o local ideal para uma curta estada nesta cidade incaracterística, cujo centro foi parcialmente destruído por um sismo, há cerca de 30 anos atrás.
Já depois da partida da Dina para Portugal, ainda tive a oportunidade de visitar o mercado Roberto Huembes, um dos mais importantes locais de comércio de Manágua.
Este mercado tradicional, o maior que visitei nos oito países que percorri nos últimos seis meses, oferece de tudo, desde bens alimentares a roupa, artesanato a serviços de beleza, num ambiente caótico, semelhante ao dos “souk” de Marrocos.
Concluída a etapa da América Latina neste meu périplo pelo mundo, vou agora fazer um desvio na rota prevista, para regressar ao Brasil, onde passarei o Natal na companhia da minha mãe e familiares que lá residem, no estado de Minas Gerais.
Logo a seguir ao Natal, retomarei a rota prevista, viajando para os E.U.A., apenas com o objectivo de visitar amigos que lá residem, e dali partir para a Nova Zelândia.
17 dezembro 2006
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3 comentários:
Feliz Natal e um muito próspero ano novo, com muitas viagens repletas de tudo o que mais desejares.
Beijo grande à Tia Lurdes.
Beijos para ti também, claro.
Carla e Tomé
Olá Fernando,
Mais uma vez, gostei de ler e de ver as fotografias.
Agora aguardo saber como se passa um Natal em Araxá. Será que também vais ter filhoses?
Beijinhos
susana
Olá Fernando,
A Inês, a Xana e eu queremos desejar-te um feliz Natal e toda a sorte (que engenho não te falta) do mundo para a segunda parte da tua viagem.
Os relatos continuam fascinantes e as fotos também!
Bjs e abraços dos Ferreira!
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